domingo, 9 de março de 2014

Um ano

Acordei cedo, planeei este fim de semana com alguma antecedência. Quero que tudo corra bem. Quero fazê-la feliz. 
Para começar em pleno, marco o pequeno-almoço na Pousada de Palmela. 
Depois, seguimos para Alter do Chão. Vamos ficar no Convento, um local onde já fui muito feliz e quero repetir essa felicidade ao lado dela. 
Ela, resume tudo o que é mais importante para mim. Tudo se resume a Ela. 
Vamos tomar o pequeno-almoço, tudo corre normalmente e em excelência, como é esperado. 
A seguir, seguimos para Alter. Vai chuviscando, mas as flores começam a aparecer e já podemos desfrutar das amarelas e das papoilas pelo caminho. 
Vou eu a conduzir, como quase sempre. Sinto-me feliz, estou em paz. Quero gozar o fim de semana em grande. Comemoramos dois anos. Exactamente dois anos. Por isso, é especial. 
Chegamos ao Hotel, quase na hora de almoço, mas só queremos descansar para já. Ela entra imediatamente na cama, desafiando-me a seguir-lhe os passos. Não consigo resistir, não consigo resistir-lhe. Tiro a roupa e mergulho nela. 
Ficamos assim um longo período, até que o telemóvel dela começa a chamá-la. 
Levanta-se, pega no telemóvel e leva-o para a cama. 
Estou quase a adormecer. Ela diz-me que é uma amiga e pede-me para ler os "disparates" que passam no chat. 
Ainda meio sonolenta, começo a ler:
-"Está tudo a correr bem?"
-"Infelizmente sim." - responde ela. 
De súbito, o meu coração fica desconcertado, não sei o que é aquilo. Não percebo. Não, enquanto a cama ainda está quente. 
Questiono-me se valerá a pena perguntar-lhe o que é aquilo. Valerá a pena a discussão? Quererei mesmo saber?
Não costumo ter medo de enfrentar as situações. Questiono-lhe. 
Começa por gritar comigo dizendo que não tenho que ler o que escreve. Lembro-a que foi ela que me chamou para ver. 
Meio sem jeito, levanta-se da cama e diz-me que está tudo acabado:
-"Esta relação não tem futuro, está tudo acabado. Tens uma semana para sair de casa."
Fico sem reação, não sei o que está a acontecer, não percebo. Só percebo que foi um erro ir viver com ela. Agora estou literalmente na rua. 
Não comento, não discuto, nem me manifesto. 
Levanto-me, vou tomar duche. Já tinha marcado jantar, não vou desmarcar. Decido ir jantar, nem que seja sozinha. Afinal, o meu coração parou. Estou em modo "ausente". 
Ela decide ir jantar, como se nada fosse. 
Falo pouco durante o jantar, quero alimentar-me mesmo. Desfrutar do vinho e da refeição. 
A seguir vou para o quarto, entro na cama e digo-lhe que quero ir cedo para casa. A casa dela, aquela que vou ter que abandonar nós próximos sete dias. 
Tento dormir, a chuva não pára de cair. Sou só um corpo. 
No dia seguinte, sigo viagem cedo de regresso. Começo a fazer as malas. Saio em cinco dias. 
Não lhe pedi explicações, não lhe perguntei se tinha alguém, não quis saber. 
Também não lhe pedi para voltar. 
O que era a comemoração de dois anos, marcou o fim macabro desta relação que terminou em formato de terror. 
Mais tarde, ela voltou a procurar-me, queria o meu corpo. Fraca de mente, cedi. Prostitui-me duas vezes em troco de esperança. Esperança que tudo fosse um engano. 
Decidi cortar relações totalmente. Não é para mim, sou mais que isso, do que um corpo. 
Ela revelou-se muito pior do pior que eu alguma vez conheci no ser humano. 

Hoje, exactamente um ano depois, abriram-me as portas, deram-me três semanas para entrar, acolheram-me e eu não hesitei. Tomei a decisão em duas horas. 
Nada há-de ser pior do que passei. 
E, em modo sobrevivência, estou num país distante, num continente diferente, numa cultura diferente. 
Caí, bati fundo, quase morri e, lá no fundo, virei-me, ergui-me e saí do buraco. 
Sempre só, a crescer e a aprender. Conheci-me ainda melhor, fiquei menos tolerante com os outros. Afastei o que não queria e quem não queria da minha vida. 

Amor? Não sei o que é. 
Prefiro assim.